Entre o estranhamento e o acolhimento da diversidade na velhice: como empatizar pelo que não é espelho?

A convivência entre gerações gera empatia, aceitação e ainda ajuda a estreitar laços de afeto dos 60+ com pessoas de outras idades. Uma relação em que todos saem ganhando. Vamos conversar sobre o beneficio da diversidade na velhice.

Lidar com a diversidade quase sempre tira da acomodação e da famosa zona de conforto. A multiplicidade, seja do que for, exige abertura para o novo. E se é novo, impõe conhecer, entender, habituar, construir um modo de relacionar com isso que se apresenta e fazer o exercício de enxergar com outras lentes.

Para os mais aventureiros ou hospitaleiros, torna-se mais divertido ou menos incômodo aproximar-se do novo. Para os mais inseguros ou rígidos, o diverso pode parecer ameaçador e sinalizar a necessidade de afastamento para se defender.

Separar todos os elementos da vida em apenas duas categorias, igual e diferente, aparentemente demanda menos energia, é menos trabalhoso. A conduta baseada nesta perspectiva geralmente consiste em aproximar o igual e repelir o diferente. Assim, é possível manter-se quase sempre no mesmo lugar, com as mesmas ideias, as mesmas ações.

Desconstruindo paradigmas

Abrir o leque retirando esse filtro mais simplista do igual versus diferente exige infinitas possibilidades de nomeação – prática mais trabalhosa, mas também mais enriquecedora. A título de ilustração e reflexão:

  • Ter uma dieta baseada sempre nos mesmos alimentos pode causar carência de alguns nutrientes;
  • Assistir somente aos mesmos programas de TV já vistos dificilmente traz novas emoções ou novos aprendizados como trazem os novos;
  • Construir explicações generalistas do tipo “toda pessoa idosa é assim”, “todo homem é assado” frequentemente leva a preconceitos, a uma invisibilização do outro, reduzindo a potência que a atenção às singularidades de cada ser pode trazer em uma relação de amizade, trabalho ou familiar.

Veja como criar empatia com quem pensa ou age diferente de nós

  1. Proponha-se escutar sem julgamento, levando em conta também os aspectos subjetivos (sentimentos, ideias, fantasias, etc.) presentes nessa fala. Muitas vezes, aí estarão pistas do que permitirá uma conexão entre profissional e paciente nessa relação de cuidado;
  2. Ao construir uma proposta terapêutica, leve em conta a história de vida da pessoa idosa. Isso favorece conhecer as suas particularidades e as diversas formas de envelhecer, bem como desconstruir preconceitos;
  3. Reflita sobre seu processo de envelhecimento. Revisitar a própria história de vida possibilita visualizar perdas e ganhos de cada etapa anterior, acolher o próprio envelhecer e se sensibilizar pelo percurso do outro;
  4. Mantenha contato com pessoas 60+ em outras situações que não envolvam necessariamente uma prestação de serviço a elas. Isso pode potencializar a troca de experiências e a quebra de estereótipos geracionais que distanciam pessoas que pertencem a gerações distintas;
  5. Acesse conteúdos de entretenimento que abordem de alguma forma o envelhecimento e a relação entre pessoas idosas e pessoas mais jovens.

Pandemia: o mesmo evento, diversas formas de viver

As formas de viver a pandemia têm sido diversas. Os mais velhos têm sofrido impactos na saúde física e mental por precisarem manter-se o máximo de tempo possível em casa, distante de suas atividades em convívio social e do contato físico sem restrições. Por outro lado, os profissionais da saúde têm sofrido os efeitos no corpo e na mente, em razão do trabalho intenso e arriscado para tratar ou prevenir a disseminação do novo coronavírus. Algumas vezes, pode parecer difícil compreender a dor do outro, quando a situação vivida parece ser o extremo oposto. Essa circunstância é tão comum, que nos versos em que Caetano Veloso se referia à sua chegada na diferente e estranha cidade de São Paulo, mas poderia relatar tantas outras vivências:

“Quando eu te encarei frente a frente não vi o meu rosto

Chamei de mau gosto o que vi, de mau gosto, mau gosto

É que Narciso acha feio o que não é espelho

(…)

E foste um difícil começo

Afasto o que não conheço”

Que o trabalho de todos os profissionais que precisam arriscar a própria vida para garantir cuidados a outras pessoas é importantíssimo e muito nobre, não restam dúvidas. Já os comportamentos de risco de algumas pessoas idosas que saem de casa, aparentemente sem necessidade, pode ser duvidoso. Não é incomum nessa situação pensar: “Como pode esta pessoa estar se arriscando a troco de nada, enquanto o que eu mais queria era poder ficar em casa?”; “Como pode alguém reclamar de excesso de tempo livre, se o que eu e tantas outras pessoas que estão trabalhando sem parar mais desejamos é ter tempo para outras coisas?”.

Longe de propor a defesa de atitudes imprudentes, o convite aqui é à reflexão que possibilite, inclusive, a sensibilização das pessoas idosas que têm tido dificuldade de seguir as medidas preventivas da covid-19. Isso porque se é difícil sentir empatia pelo que o outro passa, corre-se o risco de ofertar uma proposta de cuidados e propor soluções impessoais e que geram pouca aceitação e aderência ao tratamento.

Dicas de filmes e séries sobre a convivência entre gerações

Rosa e Momo: filme disponível na plataforma Netflix. O encontro entre um adolescente e uma mulher idosa é marcado por conflitos, identificação e aceitação. O vínculo estabelecido leva a transformações importantes na vida de cada um dos protagonistas;

This is us: seriado disponível no Amazon Prime. Intercalando passado, presente e futuro, a série apresenta a história de uma família, acompanhando a vida de cada um dos personagens. Essa alternância do tempo e a dinâmica das relações apresentada em um roteiro comovente e nada clichê são um prato cheio para visualizar como cada história de vida é construída de modo singular, bem como os impactos da bagagem de cada um na resolução de problemas atuais.

Referência:

Música: Caetano Veloso. (1978). Sampa.

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